domingo, agosto 01, 2010

O Pranto da Escavadora (trecho inicial)

I

Só o amar, só o conhecer
conta, não ter amado,
não ter conhecido. Angustia

o viver um consumado
amor. A alma já não cresce.
Assim, no calor encantado

da noite que cheia desce
pelas curvas do rio e as súbitas
visões da cidade embaçada de luzes,

ecoam ainda as mil vidas,
desamores, mistério, e miséria
dos sentidos, tornando-me inimigas

as formas do mundo, que ontem eram
ainda a minha razão de existir.
Exausto, entediado, torno por negras

praças de mercados, tristes
estradas em torno ao porto fluvial,
barracos e armazéns mistos

com os últimos prados. Lá, mortal
é o silêncio: e ali, na Viale Marconi,
estação Trastevere, é doce o final

da tarde. E lá nos seus rincões,
nos subúrbios, ligam os motores
ligeiros — vestidos ou só de calções

de trabalho, num impulso de festivo ardor —
os jovens, com amigos na garupa,
rindo e sujos. Os últimos clientes

conversam em pé e em alta
voz à noite, aqui, ali, em mesinhas
de bares ainda luzentes e semivazios.

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